RELATO DE UM ANCIÃO
A imagem de
São Sebastião veio do Curralinho por volta de 1924. Veio para o Rio Claro onde
está até hoje. Quem tomava conta da igreja era a família Pontes; Dona Mulata e
Senhor Domingos Ribeiro Pontes, irmãos que eram solteiros e que criaram uma
turma de sobrinhos. A família Pontes era muito religiosa, confessava e
comungava quando tinha missa e quem celebrava era o padre Gabriel.
No bairro
do Rio Claro residiam três famílias: Pontes, Conti e Porto. A família Porto era
muito trabalhadora, lidava com tropa de burro, ia para todos os lugares levando
e trazendo mercadoria. Os Pontes possuíam mais terras, que se estendiam do Rio
Claro até a Barra, onde eles tinham a fábrica de queijo tipo mineiro e parmesão.
Por muito tempo, a fábrica trouxe sustentabilidade para as famílias que
engordavam seus animais com o soro. Também tiravam leite e plantavam milho e
feijão.
Quando era
tempo de festa, o povo vinha para assistir à missa ponto principal, por causa
da forte religiosidade popular. O povo festava e a maioria almoçava no casarão
da praça, na casa de Dª Mulata e Sr Domingos. Eles tratavam as pessoas com
muita alegria, nunca desanimavam. O padre se hospedava por lá.
A capela de
São Sebastião era de pau a pique, que tinha o coro em volta da igreja. A mesma
ficou velha, então meu pai Vivaldi Vieira Fortes e João Catarino combinaram com
os Pontes para derrubar a igreja e fazê-la de tijolo. Em 1938, ela foi ao chão.
Meu tio Neco Vieira foi o festeiro em 1939, junto com João Catarino Ribeiro. A
festa rendeu 11 mil réis, livre de toda despesa. No ano de 1940, os festeiros
foram meu pai e o compadre Tiãozinho Vieira. A renda foi de 13 mil réis,
naquele tempo o dinheiro era réis e tostão.
E assim
todo ano as famílias por devoção e agradecimento organizavam a festa em
homenagem ao padroeiro São Sebastião, que se tornou tradição para rezar, rever
amigos e fazer o que for preciso para manter o prédio da igreja.
Sr Sebastião com os alunos Shelmer e Marcos. |
Hoje no Rio Claro só se tem a família Pontes. As famílias Porto e Conti foram em busca de outros ares. A festa só deixou saudade. Saudade dos que partiram, amigos de BH, Paraná, São Paulo, Santa Rita do Sapucaí, Lorena, Aparecida e Rio de Janeiro, além dos bairros vizinhos. Festa afamada, eternizada no sorriso da criançada e na lágrima de um ancião que escreve com uma caneta que um dia foi pena e tinteiro, na velha escola que me ensinou escrever estas linhas sobre o que foi um dia o Rio de Águas Claras e seu povo unido; povo este que construiu Pontes para o Porto e há quem Conti.
José Sebastião Vieira, 86 anos.
Tudo aqui é poesia
À noite, a madrugada.
O nascer de um novo dia
O voo da passarada
A neblina com sua magia
O frescor da alvorada.
As nascentes transbordam alegria
A doce fruta devorada
Sol que aquece e clareia
Lua que deixa a alma apaixonada
Estrelas que brilham na mesma
sintonia
Viver! Viver! E colher frutos do nada
Taquaral terra da noite e do dia
Suor em sangue na enxada
Balde branco da vaca Currupia
Vida na labuta, vida doada.
Memórias da Dona Glorinha
Vamos viajar um pouco no meu passado?
Na minha
infância morava no bairro Biguá, vim para o taquaral quando conheci meu marido,
morei duas vezes aqui no bairro, da primeira vez morei 32 anos, depois fui
morar com minhas filhas na cidade de Itajubá para elas terminarem os estudos, e
agora faz oito anos que voltei a residir aqui no bairro Taquaral.
Tive aqui no bairro doze filhos, entre eles um doente que
faleceu com poucos anos de vida, aí criei os 11 filhos que ficaram. Meus filhos
estudaram na escola dobairro Rio Claro, e como já tinha dito,depois foram para
Itajubá terminar seus estudos. Ao contrário de mim, que só estudei três anos na
escola do bairro Biguá.
O nosso bairro tem esse nome de Taquaral porque aqui tinha
muita taquara, que o povo utilizava par fazer jacá, daí surgiu o nome Taquaral.
Antigamente, aqui no bairro nossa principal atividade agrícola era a plantação
de milho, feijão, arroz em pequeno porte e batata. Não tivemos aqui nenhuma
plantação de marmelo, mas nós consumíamos bastante leite e cereais que o povo
plantava, marcando nossa gastronomia.Ervas medicinais? As pessoas daqui
costumam plantare utilizar ervas medicinais, sim, como
hortelã, marcela e arruda. Ah, ia me
esquecendo de uma dificuldade do bairro que era de ir à escola e ao médico.
Sabe, aqui
no Taquaral tinhaum morador que agora não me lembro do nome, mas que ajudou
muito o povo daqui e trouxe vários benefícios para o bairro...
Voltando a
falar de mim. Uma dificuldade que tive foi de arrumar amigos porque eu não ia à
casa dos vizinhos e nem eles vinham na minha casa.
O que me marcou foi eu
ter conseguido construir minha capela, que é aCapela de Santa Mônica, pois pedi
uma graça que ela me concedeu . Aqui no bairro tinha uma pessoa muito talentosa
que era a Cidinha do GeraldoJucoca... E
modéstia à parte, eu também tinha talento, ensinei muita menina a bordar e
meninos a fazerem tercinhos. Uma pessoa talentosa também era a parteira Dona
Maria Fume.
Ah, não posso esquecer de falar do lixo, que antigamente nós
jogávamos em qualquer local, mas graças a Deus agora temos o caminhão de coleta
da prefeitura que pega o material de
quinze em quinze dias.
Agora para finalizar nossa conversa, vou contar de uma travessura
que fiz escondida de todos. Num cômodo onde guardava arreios de cavalos,
preguei jornais nas paredes e deixei bem limpo, e comecei a dar aula para cinco
crianças que não podiam ir à escola do Rio Claro. Depois, eu trouxe uma
professora de Itajubá para dar aula às crianças que os pais tinham condições de
pagar. Ah, e quem fazia a merenda deles era eu, preparava um mingau de creme de
milho e punha nos potinhos paraservir a eles, um para cada...
Espero que tenham gostado e se precisarem demim para mais
alguma coisa e só me avisarem, tchau, tchau.
Francis Machado
Imagens: Mateus Ribeiro.
Que legal, Francis! Seu texto ficou ótimo! "Ouvi" Dona Glorinha através de suas palavras.
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